BRASIL
Tudo em nossa cultura parece fugir das regras triviais. Na mitologia grega, por exemplo, vemos deuses imponentes, desafios, grandes batalhas. A mitologia brasileira, por sua vez, mais parece uma fila do SUS. O Saci não tem uma perna, a Mula é sem cabeça, o Curupira tem o pé torto. O nosso hino nacional, do mesmo modo, é difícil de entender. Ele já começa com uma fofoca: “ouviram do Ipiranga”. Quem ouviu? O que disseram? Um baita disse me disse. O “ordem e progresso” de nossa bandeira também parece não ter sido escrito por alguém lúcido. Tudo que não temos é ordem. Já o progresso venho esperando há um bom tempo: acho que se perdeu no meio do caminho.
Sei bem que o Brasil não precisa de mais uma crônica para chamar de sua. Pelo contrário, já há tanta coisa escrita sobre o Brasil que falar algo novo torna-se difícil como ensinar um dragão de Komodo a dar a patinha. Insisto, contudo, em escrever, eis que assistimos nossa cultura sucumbir diante de nossos olhos a cada dia mais. Hoje qualquer pagodinho mais ou menos leva o título de “samba”. As bandas Calcinha Preta e Calipso fizeram com que Luiz Gonzaga e Dominguinhos deixassem de ser os símbolos do forró e do baião. Nossa língua então nem se fala: fomos completamente eclipsados pelo anglicismo. Diariamente fazemos “brainstorms”, “remakes”, “dowloads” e tantas coisas que não entendo direito. Enfim: “whatever”!
Talvez seja equivocado falar em uma cultura brasileira. Vivemos, sim, um mosaico de culturas, um emaranhado de valores, crenças e raças, que têm como denominador comum a insensatez. Ser brasileiro significa ser qualquer coisa. E, modéstia à parte, somos muito bons em ser qualquer coisa. É o católico que acredita no Candomblé; é a Xuxa com o Pelé; é o que trata a religião como esporte e o esporte como religião; é o metaleiro que toca Roupa Nova no final de semana para não morrer de fome; é o que fala com sotaque carioca no cinza paulista.
Não temos vulcões e terremotos. O mais perto disso que temos é o carnaval. Sim, ele faz um estrago. Nunca nos envolvemos em guerras. Viramos república sem queda da Bastilha, saímos da ditadura com pouca luta armada e apenas demos uma passadinha na Segunda Guerra Mundial. Apesar disso tudo, ouvi em algum lugar que “verás que um filho seu não foge à luta”. Espero não viver para ver essa luta. Já basta ter visto o Anderson Silva ter levado aquele nocaute do gringo.
O que espero, sinceramente, é ver apagadas as cores Kafikianas que colorem nosso futuro e, no frigir dos ovos, ter a certeza de que nossa identidade e amor pelo país permanecerão inabalados dentro de nós.
Prof Gabriel Dolabela |
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