quarta-feira, 30 de maio de 2018

Preconceito além de crime, machuca. Você sabia?



Iniciar esse assunto falando de preconceito, sinceramente, não é uma tarefa fácil.
Pensar, compreender, identificar e aceitar que todo sujeito, carrega algum tipo de preconceito - já que “nenhum homem pode viver sem preconceitos” - é no mínimo reflexivo. Contudo, incabível pensar que o sujeito – ainda - fortalece uma divisão entre “nós” e “eles”. Mesmo com a Lei n o 7.716, de 5 de janeiro de 1989, passam a vigorar com a seguinte redação: “Art. 1o Serão punidos, na forma desta Lei, os crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional." Art. 20. Praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional. Pena: reclusão de um a três anos e multa”. Ou seja, preconceito é crime! Aliás, além disso, é feio.
Infelizmente, o preconceito está inserido no meio social, sendo um artifício usado no convívio e nos momentos em que nos defrontamos sempre com o novo, desconhecido, o não familiar ou o diferente; ou seja, o tempo todo. Sabe-se que o preconceito é uma ideia ou opinião formada de algo. Resumidamente, é caracterizado quanto um juízo preconcebido é manifestado na forma de atitude ou comportamento discriminatório perante pessoas, sob condições, limitações, opções, lugares, tradições, crenças, etc. É inadmissível, além de doloroso, pensar que alguém possa sentir ou disseminar ódio, hostilidade ou repulsa por conta da opção, condição, características ou particularidades de alguém.  Todo preconceito é intrínseco. Sendo assim, não podemos negar que preconceito é preconceito em qualquer lugar. Presente aí, aqui, em todo canto. Está em você, dentro de alguém, nas casas, nas redes sociais, em processos seletivos, nas ruas, nas escolas, nas organizações, etc.  Ideal seria pensar na inclusão, na disponibilidade das pessoas para integrar, compartilhar e aceitar a diversidade permitindo que as pessoas pudessem ser elas - sem mentiras, sem vergonha, sem que o sujeito “diferente” tivesse que deixar a vida dele do lado de fora, somente para alegrar alguém que não suporta as diferenças. 
Há tempo o assunto não conscientiza. Há anos a mudança é necessária. Já passou do tempo de pensar que a palavra de ordem não é tolerar e sim, RESPEITAR. 
Creio que a base da mudança está na educação, no amor ao próximo, no olhar para o ser humano, no entendimento da vivência em um mundo plural, etc. Pensando em combater o viés inconsciente - todo mundo tem -  ou a resistência de algumas pessoas opto pela capacitação, conscientização, vontade de conhecer, leitura, empatia, orientação e conversa. Somente a informação elimina o prejulgamento de algo e alimenta o sujeito de conhecimento. Em relação às organizações, devem atuar com verdade. Nada adianta falar de diversidade se o quadro de colaboradores não estampa essa realidade ou, se não há investimento em processos de capacitação para orientar e/ou preparar as pessoas para a inclusão e/ou convívio.
O tempo, as aulas, os relatos revelam que todos (inclusive as organizações) precisam apresentar disposição e interesse para compreender que o assunto inclusão e/ou diversidade é dever de todos. Somente o interesse, informação, querer e motivação fomentam esse processo.
Se todos entendessem ou lembrassem o quão delicioso é ser feliz, certamente, permitiríamos a felicidade do outro. No latim, a palavra respeito significa “olhar outra vez”. Assim, algo que merece um segundo olhar é algo digno de respeito. Portanto, olhe de novo. Permita. Coloque a lente do amor. Entenda que devemos admirar o caráter, competências, educação, histórias, expertises, vivências e tantas outras coisas que estão muito além das nossas escolhas particulares , limitações ou características físicas.
Pensa ai!
Enquanto pensa aqui, concluo feliz por escrever e afirmar: "minha vida, minhas regras. Sua vida eu RESPEITO". Seja você!




Regina Célia Alves Vargas Pires. Mestre em Recursos Humanos e Gestão do Conhecimento. Docente no Centro Universitário Faculdades Metropolitanas Unidas.

quarta-feira, 23 de maio de 2018

E por falar em crise: as turbulências de 1864 e 1875


Ontem estava lecionando em uma turma de MBA e por conta de uma pergunta, entramos numa discussão sobre a crise atual, que rapidamente derivou para “crises” no geral. Inicialmente tive certa dificuldade para tratar do assunto, pois tentei referenciar o debate nas experiências dos próprios alunos, entretanto logo percebi meu erro, já que a maioria deles nunca tinha passado por uma crise antes de agora.
Então, mudei o foco para uma visão histórica. Resolvi contar as histórias de nossas crises econômicas e tive a grata surpresa de perceber o interesse deles mas, ao mesmo tempo, certa tristeza pelo completo desconhecimento dos mais jovens sobre a história brasileira.
De toda maneira para não começar dos equívocos da carta de Caminha, resolvi iniciar a conversar com eles sobre a crise da segunda metade do século XIX. Abri o assunto falando do sucesso da economia cafeeira no Segundo Reinado, lembrando que graças ao café, de modo geral, a administração do Império manteve elevada as exportações brasileiras, cujo volume físico na primeira década do século cresceu em 214%. Mostrei, por exemplo, que em 1821 o café gerou a exportação de 129 mil sacas que saltaram para 1.383 mil sacas em 1840.
Porém o importante em nossa conversa foi apontar que para além dos volumes produzidos, na época o café possibilitou crescimento da renda, não só para a região cafeeira, como para o país como um todo. Assim, os anos de prosperidade econômica, ao estabelecer novas e bem-sucedidas condições econômicas, começam a criar novas relações sociais de produção que aos poucos se distanciavam das relações típicas da agricultura mercantil-escravista sendo, portanto, que inicia-se uma transformação que estimulou negócios urbanos no Brasil e, principalmente, a gradual implantação do trabalho assalariado em diversas regiões do país e nos mais diversos campos de atividades, inclusive na própria indústria de café, mormente, no oeste paulista.
O legal foi que a turma construiu a compreensão de que frente a essas novas condições, o país como um todo cresceu e diversas atividades ganharam robustez, entre elas aquelas ligadas à comercialização e mesmo as financeiras, o que fez expandir o poder econômico da burguesia urbana brasileira, ou seja, de pessoas que mantinham seus negócios sem vínculos diretos com a propriedade e a atividade rural.
Os lembrei também que associado a isso, o período é marcado por uma significativa tranquilidade política, sendo que o fim dos conflitos separatistas e a organização do parlamentarismo (mesmo que às avessas) foram os principais agentes dessa estabilidade.
O Barão de Mauá
Bem, apresentado o apogeu, expliquei o declínio e o início da crise como sendo provocada pela flutuação do preço internacional do café e, consequentemente, pelas quebras no comércio e na indústria. Observei que, em verdade, há várias interpretações sobre a origem daquela crise, contudo, me baseava na informação de que nos meses que antecederam setembro de 1864, o café havia caído 15 pontos nas Bolsas de Mercadoria de Londres e Nova Iorque e o açúcar, mais de 30. O câmbio, contudo, manteve-se estável para manter as remunerações, em mil-réis, do cafeicultor e que o governo definiu os limites do socorro tecnicamente possível de ser prestado pelo Banco do Brasil, sendo que algumas casas bancárias já o haviam ultrapassado. Uma delas, a Antônio José Alves Souto & Cia, das maiores e mais importantes do país, não pôde mais honrar os saques contra ela e fechou suas portas no dia 10 de setembro de 1864. Era, até ali, a maior crise econômica do Império e entrou para a história como a “quebra do Souto”.
De fato, a “quebra do Souto” foi o prenúncio de outras crises que viriam anos depois. Em maio de 1875, novamente se deteriora a situação financeira. O Banco Mauá-MacGregor entra em moratória, na sequência o Banco Nacional suspende os pagamentos, para finalmente o Banco Alemão também se ver obrigado a fechar as portas. Já que os bancos da época estavam ligados ou ao monopólio comercial (como era o caso da Casa Souto) ou ao esboço manufatureiro existente no país (como o Mauá-MacGregor), pode-se ter como certo que as crises de insolvência que se propagaram impactaram a totalidade da economia.
Tal momento de crise do séc XIX se agrava pela dificuldade da elite econômica cafeicultora tradicional que, durante décadas havia burlado com sucesso a situação de grande endividamento, precisava agora reduzir suas posições passivas, pois não tinham mais como se manter pela lógica de geração de valor no escravismo. Era o início do fim dos Barões do Café.
Em resumo, acabamos concluído que, seja por dimensões objetivas ou subjetivas, o efeito daquelas crises foi que um novo segmento da elite econômica assumiu e ergueu uma economia doméstica a qual se tipificou não só por um novo sistema de produção, mas também por um projeto modernizador para a sociedade brasileira.
Foi uma aula legal. Mas assim como no vôlei não se deixa de "cortar" bola levantada na rede, me permiti a pergunta, para qual estou aguardando a resposta deles: Que padrão de sociedade emergirá da crise que estamos vivendo?



Ronaldo Rangel é doutor em desenvolvimento econômico pela Unicamp, ex-professor-concursado da Unifesp - Universidade Federal de São Paulo e docente de programas lato sensu da FGV, UNICAMP e EPN.