Charles Chaplin, no seu clássico "Tempos Modernos", mostrou
claramente a todos o que estava acontecendo com o mundo. De forma bem-humorada
ridicularizou o trabalho de seu tempo e, tragicamente, sugeriu que a
desumanização do trabalhador veio para ficar. Se não ficou, não foi por sorte,
mas porque o mundo mudou, o trabalhador daquele filme e daquele tempo não
ficou.
Esse era o padrão metal-mecânico (Fordismo), no qual o trabalhador
precisava aprender a realizar sua função e as relações de trabalho eram
extremamente hierarquizadas e estáveis.
Clica... Clica... Clica...
Três cliques depois, um consumidor como tantos outros terminou de realizar
sua compra do mês. No final da tarde sua campainha irá tocar, ele deixará seu
escritório para receber os funcionários do estabelecimento e os observar enquanto
sua dispensa é abastecida. Só depois ele poderá novamente pegar uma lata de
cerveja para beber enquanto trabalha.
Na era do clique a flexibilidade exigida dilui a hierarquização tradicional
e altera a forma de contratação empregatícia; da mesma forma foram banidas
certas habilidades e funções com a chegada da economia digital, sendo criadas
novas profissões com base em novas especialidades.
Se no passado as empresas produziam para o consumo de massa, no chamado
padrão micro-eletrônico (Toyotismo) produz-se apenas o necessário, com
qualidade e personalização ao gosto (e bolso) do cliente. Mesmo as empresas do
padrão antigo encontram-se alterando sua estratégia de produção.
Continua-se produzindo muito, mas seletivamente, pois precisam agradar a
todos os clientes, independentemente de renda. Para elas, antes era mais
simples: os anseios dos clientes eram padronizados, já que a produção precisava
escoar.
Mas terá o padrão anterior sido abolido do mundo? Acreditamos que não. Ao
invés disso, cremos na alteração das relações Capital x Trabalho e em um MIX do
Fordismo e Toyotismo.
O trabalhador dos “nossos tempos modernos” (e não o do Chaplin) anda tendo
uma trajetória diferente, em que não está mais bem definida a fronteira entre
onde começa e termina a jornada de trabalho. Além disso tem estado exposto a
todo momento, ou seja, possui a sensação ou responsabilidade de estar sempre
conectado para satisfazer as necessidades do seu cliente potencial. Sem contar
que tem desenvolvido a capacidade de ser “multitarefa” e solucionador de
problemas que os trabalhadores dos “tempos modernos de Chaplin” nem se
imaginavam ser.
Também não se pode dizer que estudamos e estamos capacitados para o mercado
de trabalho, pois deve-se estar sempre mais preparado e atualizado tecnologicamente
e culturalmente que no dia anterior. Isso para se evitar a estagnação e a
obsolescência, que impossibilitam de se competir no atual modelo corporativo
globalizado. O conhecimento está mais acessível e a informação flui mais
rapidamente, possibilitando o surgimento de novas ideias que podem gerar novos
produtos. Surgem a cada dia empresas de muito baixo capital, formais e
informais, terceirizadas, prestadoras de serviços, autônomos, aumentando a
pulverização do mercado. Mas se uma ideia é boa o bastante para que uma grande
corporação a compre, volta-se a verificar o tradicional padrão de concentração
do mercado. O profissional dessa nova era tecnológica necessita adaptar-se às
fusões corporativas (concentrações) como também às terceirizações e
subcontratações. Ou seja, deve ter capacidade de se viver tanto no modelo
anterior como também no atual modelo econômico, marcado pelas pulverizações
seja do conhecimento ou das empresas prestadoras de serviços terceirizadas, as
quais alteram formas de contratação no mercado (diminuindo ou excluindo)
qualquer tipo de vínculo empregatício.
Isso não é exatamente ruim. Convenhamos, do que adianta ter o conhecimento
sobre algo se não podemos “compartilhar”, disseminar e acumular? Pois então,
ainda seremos dependentes das "empresas concentradoras" para que
nosso conhecimento seja transformado em benfeitorias e produtos, e sejam
escoados no mercado.
Cada vez mais as empresas fazem o uso dos conhecimentos pulverizados e da
tecnologia para melhorar seu processo fabril, melhorar seus produtos, ter um
modelo logístico informatizado e estratégico - permitindo que o produto escoe
não mais do Oiapoque ao Chuí, mas de Timbaúba (Pernambuco) ao Timaru (Nova Zelândia).
Assim, se mantêm no mercado, produzindo equipamentos com ciclos de vida
reduzidos e com alto índice de obsolescência, fomentando um mercado seletivo e
em massa, atendendo os anseios de cada tipo de consumidor por produtos cada vez
mais sofisticados e acessíveis. Por exemplo, computadores!
A indústria de computadores não possui estoque de seus produtos: produz
equipamentos de acordo com o gosto e poder de compra do cliente. O consumidor
pode comprar um produto personalizado pela web, optando por componentes caros
da mais alta tecnologia; ou componentes de grande tecnologia, porém mais
baratos e menos performáticos. O produto será composto por componentes vindos
de toda a parte o mundo e será produzido em uma linha de produção de alta
produtividade, que possui flexibilidade para mudar ou produzir diferentes produtos.
Em poucos dias o computador é entregue, e se o consumidor for corporativo,
ainda terá acesso a consultores técnicos e de venda 24 horas por dia.
Esses consultores não são contatados via telefone fixo, mas ficam em Home
Office, disponíveis via celular e munidos de seus laptops, podendo acessar o
sistema da empresa e fornecer uma proposta de produto a qualquer momento.
Ao que tudo indica, esse será o perfil do mundo globalizado. Facilidade,
disponibilidade, flexibilidade, personalização, terceirização são palavras da
moda, e assim devem permanecer por algum tempo. No entanto a tecnologia
continua avançando, as inovações seguem acontecendo, as relações humanas vão se
desenvolvendo, e não será de se espantar se houver, no futuro, novos
"tempos modernos". Afinal, a economia é cíclica, e logo após um ciclo
chega outro. E então? Como será a economia pós-digital?
Fábio Rigo é
engenheiro de computação pela Unicamp com MBA em Gestão Estratégica de TI na
FGV.
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