Aguardado há mais de um ano pelas empresas, o Decreto nº 8.420, que regulamenta a
Lei Anticorrupção (12.846, de 2013), foi publicado dia 19/3 e surpreendeu positivamente
advogados que acompanham o tema. A única observação negativa em comum continua
a ser em relação ao acordo de leniência, que na avaliação dos profissionais não
oferece a segurança necessária às companhias que quiserem aderir a um acordo.
A análise é que, apesar da demora, a redação do regulamento ficou muito além das
expectativas, por deixar clara a forma de cálculo das multas, detalhar os programas
preventivos a serem adotados pelas companhias (compliance) para a redução das
possíveis penas e por avançar, em alguns pontos, em relação à própria lei.
Um dos pontos positivos destacados pela advogada Isabel Franco, sócia do Koury,
Lopes Advogados, foi a dosimetria das multas, que considera os atos praticados
pela empresa e o valor de contratos. Nesse caso, para cada ato, há um percentual a ser
aplicado. A Lei nº 12.846 diz apenas que a multa aplicada a empresas envolvidas em atos
de corrupção pode variar de 0,1% a 20% do faturamento bruto do exercício anterior.
Pelo decreto, se há a continuidade do ato, por exemplo, a empresa pode ser multada de 1%
a 2,5% . O que se aplicará, por exemplo, à companhia que paga periodicamente propina
em determinado esquema. A esse ato, podem ser somados outros, chegando-se ao fim
ao percentual máximo de 20% sobre o faturamento.
De acordo com o decreto, o percentual isolado mais alto, de 5%, seria aplicado ao caso
de reincidência em menos de cinco anos, a contar da publicação da infração anterior.
Outro parâmetro determinado para o cálculo das multas é o valor do contrato.
Se for de até R$ 10 milhões, aplica-se multa de 1%. Caso ultrapasse R$ 1 bilhão,
sobe para 5%.
O decreto também prevê atenuantes que representam descontos à multa. Se a empresa
comunicar à autoridade administrativa sobre o ato de corrupção antes de instalação
de processo administrativo, a redução será de 2%. "A medida é relevante
porque estimula a autodenúncia", avaliam os advogados José Barreto Neto e J
osé Alves Ribeiro, do Vaz, Barreto, Shingaki & Oioli Advogados.
O advogado Giovanni Falcetta, sócio do Aidar SBZ, afirma que o decreto está mais
detalhado do que se esperava e traz práticas previstas nas leis americanas e inglesas.
É o caso do programa de compliance, denominado no decreto de Programa de Integridade.
Segundo ele, os pilares das normas estrangeiras foram adotados, apesar de
não trazer todas as possibilidades.
As medidas de compliance elencadas para possibilitar a redução da multa, porém,
eram aguardadas pelas empresas de grande porte que já cumprem o
Foreign Corrupt Practices Act (FCPA). Uma das que mais chamam a atenção
é a exigência de transparência em doações a partidos políticos. "Isso pode requerer
uma política interna com regras públicas sobre quando e porque a empresa fará esse
tipo de doação", dizem Barreto e Ribeiro.
Um maior rigor nos controles internos também está na lista de exigências para
redução do valor das penas. "Se a empresa for rápida em demonstrar que os
lançamentos contábeis refletem a realidade da operação, sem maquiagem, terá mais
chances de ter uma eventual multa reduzida", afirma a advogada
Thais Folgosi Françoso, sócia do Fernandes, Figueiredo Advogados.
Thais critica apenas o fato de as várias regulamentações regionais poderem
causar conflitos de competência e da empresa que fechar um acordo de leniência
com a Controladoria-Geral da União (CGU) continuar a correr o risco de ser
processada, assim como seus executivos na seara penal, pelo Ministério Público.
Outro ponto positivo, de acordo com Giovanni Falcetta, é o fato de o decreto trazer prazo
e momento em que a empresa poderá sair do Cadastro Nacional de Empresas Punidas.
Com a abertura dos primeiros processos administrativos pela CGU contra mais
de 20 empresas supostamente envolvidas na Operação Lava-Jato, começaram a surgir
várias dúvidas sobre o processo administrativo. "O decreto traz mais detalhes sobre isso.
Por exemplo, a comissão de apuração de responsabilidade terá um prazo
para a conclusão da investigação preliminar, que não pode exceder 60 dias,
prorrogáveis mediante solicitação justificada pela presidente da comissão.
Antes só havia o prazo de 180 dias para a conclusão do relatório final",
afirma Claudia Bonelli, sócia integrante do grupo de compliance do TozziniFreire Advogados.
O professor da FGV Direito São Paulo e procurador da República, Rodrigo De Grandis,
afirma que, em uma análise ampla, o decreto é positivo, principamente em relação
ao detalhamento do programa de integração. Ele acredita, porém, que a lei só f
uncionará bem se a CGU tiver instrumentos técnicos e humanos necessários
para desenvolver esse trabalho.
Laura Ignacio e Zínia Baeta
fonte: http://www.aasp.org.br/ - Associação do Advogados de São Paulo
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