Educação:
A alternativa neo-conservadora ou a Flexibilidade de Fato?
a abstração e a física newtoniana
“Não há flexibilidade no vácuo. Para que um
corpo seja flexível,
é
necessário que haja, ao menos, um ponto de atuação de força”
Revendo
a farta bibliografia sobre a neo-reforma educacional, vamos verificar
que esta ótica de pensamento afirmar que em educação as opções técnicas são as
únicas garantias de que os interesses universais, demandados pela sociedade
serão atendidos. Para tanto, é necessário o isolamento do centro de decisão
sobre as metas educacionais – aspectos apregoados nos Pareceres do CNE em nome
da autonomia universitária – dos grupos politicamente organizados, por mais
representativos e populares que possam ser.
O CNE
parece seguir o discurso teórico que sugere uma desideologização da educação, a
qual se fundaria em novos compromissos baseados nos princípios da sociedade do
conhecimento, qualidade total, educação para a competitividade, formação
abstrata e polivalente e outras tantas categorias que, ao fim e ao cabo,
segundo essas opiniões, dizem respeito à modernização educacional,
indispensável nos dias atuais.
Não sem
sentido, portanto, encontram-se na bibliografia sobre o tema assertivas como:
“Diante desse cenário, a educação é convocada, talvez prioritariamente, para
expressar uma nova relação entre desenvolvimento e democracia como um dos
fatores que podem contribuir para associar o crescimento econômico à melhoria
da qualidade de vida e à consolidação dos valores democráticos”[1].
Nesses termos, a educação seria o elo de ligação entre o desenvolvimento humano e a modernização pretendida, não sendo factível qualquer forma
de intervenção, quer de movimentos sociais, quer de tradicionais estruturas de
organização política ou de categorias profissionais, já que essas levaram, no
passado, a um quadro educacional caótico e impediriam, no presente, meios
autônomos que atuem sobre a escola institucionalizada, através da competição.
Em
outras palavras, as teses neoliberais na educação partem da hipótese de que a
equidade e a própria democracia dependem da ordem econômica de mercado e que a
ação de qualquer espécie de ator (partidos políticos, corporações, ONG’S, e
mesmo intelectuais), por práticas doutrinárias e pedagógicas estreitas, é
empecilho para uma reforma consistente do meio educacional.
Contudo,
não se pode cometer o erro (aliás injusto) de reduzir os Pareceres do CNE a uma
reprodução retórica destes argumentos teóricos. Pois o teor dos textos
apresentados, para além de conceitos pré-definidos, reconhece a transitoriedade
das transformações e a necessidade de conciliação entre o mundo desejável
e as possibilidades do mundo vivenciado,
habilmente deslocando o foco do conflito entre desejável e vivenciado e
o localizando na incapacidade de se entender a mudança. Dito de outra
forma aponta para uma “crise institucional” na educação superior que se funda
na incapacidade das instituições envolvidas em reconhecer e aceitar o contexto
das mutações da ordem social.
Não sem
motivo ao discorrer, por exemplo, sobre o “Legado e o Percurso Institucional”,
o CNE evidencia que a experiência histórica da formação educacional e
profissional no Brasil é marcada por relações entre Universidade e Corporações
orientadas sob a égide da tutela na qual a Lei sempre aparece ou sobre a forma
do privilégio ou da repressão o que garantiu uma matriz clientelista ou se
preferirmos “corporativa nacional, não diversa, senão indivisível”[2],
aduzindo que tal orientação não tem mais espaço na “nova época”, sendo, por
conseguinte, não-natural e refutável.
É
evidente que um primeiro esforço para nos auxiliar a formular contraposições
aos Pareceres do CNE seria a de invocar os críticos ao neoliberalismo na
educação[3],
apontar com embasamento teórico, por exemplo, os riscos da adoção
indiscriminada de princípios neoliberais de flexibilidade e de pequena duração
de cursos. Contudo, devemos reconhecer que a literatura publicada nesse
sentido, e vale observar, bastante ampla, não é, ainda, capaz de apresentar ou
formular nenhuma proposta que se anteponha efetivamente às teses sugeridas
pelos novos conservadores, sendo que tais autores não conseguem avançar
para muito além da denúncia.
Por
óbvio algumas concepções de cunho teórico, devem ser incorporadas ao debate,
como por exemplo os enfoques do neocapital humano enunciados pelo Prof.
Gaudêncio Frigotto[4] numa
esplendida evolução e continuação de seu livro de 1989. Entretanto, aqui
também, a par da recusa consubstanciada de que a reestruturação capitalista e
os desdobramentos da sociedade pós-industrial imporiam, inexoravelmente, um
sistema educacional de cunho liberal, não se alcança nada além da crítica à
validade de políticas neoliberais no plano educacional.
Nesses
termos – aceitando a armadilha – só nos resta a alternativa de compreendermos a
mudança, para somente então discutirmos os novos paradigmas? Estamos, de fato,
como propõe os Pareceres do CNE, diante da inevitável situação de visualizar os
“caminhos da modernidade e da flexibilização, a luz das transformações em
processo”?
Em
outras palavras devemos aceitar a abstração de cursos etéreos que não preparam
os indivíduos para uma formação sólida e holística e fingir que estamos
habilitando profissionais para o mundo do trabalho que não permanecerá estável
ou devemos aceitar os preceitos da física newtoniana e encontrar pontos de
atuação de força que não empeçam e garantam a flexibilidade necessária do
profissional exigido pelo mundo do trabalho, mas que acima de tudo que garantam
uma formação teórica sólida e consistente que permita aos profissionais da área
de exatas que se ajustem de maneira sólida e rigorosa a todas as transformações
tecnológica que possam, e certamente advirão no futuro.
Ronaldo Rangel é professor da Escola Paulista de Negócios |
[1]
Mello, G. Cidadania e Competitividade - desafios educacionais do terceiro
milênio. São Paulo, Ed. Cortez.
[4] Ver: FRIGOTTO,G Educação e a Crise do Capitalismo Real, Cortes Editora.
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